O analista que segue Angola na Moody`s estima que a dívida pública deve aumentar para cerca de 110% do Produto Interno Bruto e que o país deverá sofrer uma recessão de 0,9% este ano. Provavelmente a solução não passa por João Lourenço pedir (ainda mais) ajuda ao Povo nem por fundir ministérios. Mas, isso sim, por o Presidente entender que o MPLA não é uma solução para o problema. Sendo antes um (enorme) problema para a solução.
“P revemos que a dívida pública de Angola aumente ainda mais este ano para perto de 110% do PIB”, disse Aurelien Mali em entrevista à Lusa, na qual alertou que este rácio pode ser revisto no final da avaliação que a Moody`s está a fazer ao país.
A agência de notação financeira Moody`s anunciou já que se prepara para rever em baixa o `rating` de Angola devido à magnitude do choque dos preços do petróleo e à deterioração das condições financeiras do país. Por outras palavras, deve-se à manifesta incompetência do governo liderado por João Lourenço.
Questionado sobre a actualização das previsões macroeconómicas para o país, Aurelien Mali respondeu que a Moody`s, para além de prever uma dívida pública perto de 110% este ano, estima também que a economia continue com um crescimento negativo.
“Para este ano prevemos uma recessão de 0,9%, face ao crescimento negativo de 1,2% registado em 2019”, disse o analista, confirmando assim que Angola deverá continuar em recessão pelo quinto ano consecutivo, mas mais suave que a previsão da ministra das Finanças angolana, que aponta para um crescimento negativo um pouco acima de 1%.
O aumento da dívida pública nos países africanos produtores de petróleo, em particular, e um pouco por todo o continente, de uma forma geral, tem merecido várias análises das instituições financeiras internacionais, com o Fundo Monetário Internacional a assumir diversas vezes que o rácio, que em média ultrapassa os 50% do PIB, apresenta uma trajectória preocupante.
Para Aurelien Mali, as propostas apresentadas quer pelos ministros das Finanças africanos durante as reuniões da Comissão Económica das Nações Unidas para África, quer pelo próprio FMI e pelo Banco Mundial, não são ainda claras sobre qual o montante nem qual a abrangência do perdão de dívida que é proposto.
Certo, sublinhou, é que “Angola já não é elegível [para receber apoio] ao abrigo da Associação para o Desenvolvimento Internacional”, o braço do Banco Mundial para canalizar ajuda para os países mais pobres, já que está num patamar médio relativamente aos rendimentos dos cidadãos.
Num comentário publicado esta semana, ainda antes de os ministros das Finanças africanos alargarem o pedido de perdão de juros da dívida deste ano para a totalidade dos pagamentos da dívida nos próximos três anos, a Moody´s alertava que “não é claro se o alívio da dívida oficial vai ser condicionada à participação dos credores do sector privado nalguns ou em todos os casos, ou se a pressão vai ser colocada nos devedores ou nos credores do sector privado que aceitem participar”.
Nesse comentário, a Moody`s escrevia ainda que muitos países da África Subsaariana usam menos as instituições financeiras multilaterais e recorrem mais a instrumentos como a emissão de dívida soberana nos mercados financeiros.
“Os países emergentes, principalmente na África Subsaariana e na Ásia, mudaram o foco das emissões para dívida não concessionada, usando instrumentos baseados no mercado nos últimos anos, o que complica o processo de aliviar eficazmente a dívida usando os canais oficiais”, isto é, os países.
Certo é que, independentemente dos contornos do modelo, “um aumento do risco de atrasos nos pagamentos da dívida ou do serviço da dívida constitui um Incumprimento Financeiro (“default”) de acordo com a nossa definição”.
Há muito tempo que o Governo do MPLA (afinal o único no Poder desde 1975) foi aconselhado a “endividar-se de forma sensata” sob perigo de entrar em situação de incumprimento financeiro devido ao que melhor sabe fazer – endividar-se.
O pagamento da dívida já é a maior rubrica de despesa em Angola e o país tem de equilibrar a sua necessidade de investimento com o endividamento sensato, se quiser evitar uma situação de default.
Sobre a relação entre a China e Angola, recorde-se o pacote de financiamento de 11 mil milhões de dólares, acordado entre as autoridades dos dois países no Fórum de Cooperação China-África (FOCAC), que decorreu em Pequim, e no qual o Presidente de Angola, João Lourenço, participou pessoalmente.
Esse pacote de crédito da China é significativo; no entanto, apesar de ter ajudado a desbloquear financiamento para pagar os tão necessários investimentos, também aumentou o fardo da dívida nacional, tendo aliás coincidido com a ajuda de 4,5 mil milhões de dólares do Fundo Monetário Internacional.
Em Dezembro de 2017 Angola devia à China mais de 21 mil milhões de dólares, dos quais 5,2 mil milhões de dólares ao Banco de Importações e Exportações da China, e o restante a bancos públicos.
Esta metodologia errante é criticável principalmente em relação à importação de materiais e mão-de-obra chineses, que faz pouco pela criação de empregos locais e pelo desenvolvimento do sector nacional da indústria.
O Presidente João Lourenço agradeceu, em Pequim, ao homólogo chinês, Xi Jinping, a ajuda ao processo de reconstrução nacional em Angola, país devastado por um tsunami de incompetência governativa, ladroagem e corrupção (entre muitos outros crimes) com a chancela do MPLA.
João Lourenço reafirma que Angola encontrou na China um parceiro que está a ajudar a construir o país e que foi o país asiático “quem estendeu a mão na fase de reconstrução nacional”.
É claro que, sobretudo numa altura em que se está de mãos estendidas, não é tempo de João Lourenço pensar na factura e nos custos dessa ajuda, grande parte dela dispensável se o partido que governa Angola desde 1975 não fosse corrupto e em vez de trabalhar para os poucos que têm milhões fizesse alguma coisa útil para os milhões que têm pouco ou… nada.
Vagas ideias e ideias vagas
No seguimento da terceira tranche de apoio do FMI, o fantasma do incumprimento financeiro devido ao elevado nível de pagamentos de dívida e à forte dependência das receitas petrolíferas, estacionou em Luanda.
Depois de Angola não ter conseguido cumprir vários das metas do Programa de Financiamento Ampliado (PFI) do Fundo Monetário Internacional, o FMI concordou com novos objectivos. O calendário foi alterado e novas metas foram definidas, destinadas a apoiar a consolidação e a transparência, e para apoiar a reestruturação do sector financeiro.
O nível de dívida pública estava na altura nos 90,1% do PIB, quando estava em 35% em 2013, e o serviço da dívida representava 56,8% da despesa total prevista no Orçamento para 2020. Chegaram então diversos avisos ao governo: “Uma gestão cuidadosa deste portefólio e dos futuros financiamentos da dívida serão críticos se Angola quiser evitar um nível ainda mais oneroso de dívida ou o risco de incumprimento financeiro”.
No princípio de Dezembro de 2019, o FMI alertou que “a dívida de Angola permanece sustentável, mas o rácio da dívida pública face ao Produto Interno Bruto aumentou substancialmente, e os já de si elevados riscos subiram ainda mais”, estimando um rácio de 111% face ao PIB, que deveria descer para cerca de 70% até final do programa de ajustamento, em 2024.
A dívida angolana continua altamente vulnerável a choques macroeconómicos e orçamentais, com os principais riscos para a sustentabilidade da divida a virem de uma depreciação da taxa de câmbio mais rápida que o previsto, mais declínios nos preços ou na produção petrolífera, deterioração no acesso aos mercados financeiros e materialização de riscos vários, incluindo de dívida garantida pelo Estado.
Até chegar ao Poder, João Lourenço (como todo o MPLA) tinha um inimigo que lhe tirava o sono, mesmo não passando de um fantasma: Jonas Savimbi. No entanto, descobriu que – pelo sim e pelo não – era urgente encontrar um (ou mais) bode expiatório vivo para os sucessivos fracassos, para a descoberta de muitos dos seus telhados de vidro, para justificar junto do Povo, mas sobretudo da comunidade internacional que lhe empresta milhões, a razão pela qual a montanha vai parir um rato.
E então quem melhor do que a família Dos Santos (que ele próprio reverenciava num paradigmático culto canino) para “desempenhar” esse papel? Sendo o patriarca já um ancião, João Lourenço elegeu os seus filhos, dando especial relevo a Isabel dos Santos que, mais a nível internacional, tem demonstrado que o rei vai nu e que quem nasce lussengue nunca chegará a ser jacaré… por muitos esteróides anabolizantes que lhe injectem.
João Lourenço conta agora com novos aliados na sua suposta senda de justiceiro. Todos (ou quase) os que criticaram (desculpem a imodéstia, mas nesta matéria de críticas o Folha 8 está no pódio e mantém-se onde sempre esteve) José Eduardo dos Santos por décadas de actividades cleptocráticas estão agora rendidos a João Lourenço. Para estes, quem roubou uma vez é ladrão para sempre, e quem ficou a proteger o ladrão é um herói. E no rol de crimes figuram todos os roubos, mesmo os que não cometeu, mesmo os que o não foram por estarem respaldados na lei.
Isabel (dos Santos) passou a ser sinónimo de crime pela mão do “juiz” João Lourenço. “Juiz” que antes foi vice-presidente do MPLA, ministro de Dos Santos, propagandista da capacidade do “arquitecto da paz” e do “escolhido de Deus”.
Por fim, eis que uma pandemia internacional (Covid-19) veio mostrar que João Lourenço e a sua equipa ainda não perceberam que o Governo está em cima de um tapete rolante que anda para trás. Assim, continua a caminhar e propagandear os seus progressos governativos. Mas como o tapete anda para trás, afinal não saíram do mesmo sítio.
Folha 8 com Lusa